terça-feira, 13 de abril de 2010

Sobre a Beleza.


Eu vi a beleza. Digo, porque presenciei. A beleza é pequena, tem olhos negros, a voz modulada. Não diria, se fosse uma coisa qualquer. Era a beleza inteira, encarnada. Eu estava presente quando a beleza se manifestou. Sinto-me privilegiado. Era o justo momento. Não pude tocá-la, mas esquadrinhei-a com meus olhos. Era imaculada. Eu pude saber – a beleza é pequena, grave, quase acanhada em seu exaustivo labor. Revelo: era um ele. Mas podia ser um ela, podia ser um ele-ela. Mas era um ele, e tinha partes, tinha os ornamentos, tinha os braços. Que foi nos braços da beleza (nos braços dele) que eu fiz a pesquisa de campo. Eram brancos, digo, com a veias azuis transparescentes. A beleza tem carne – eu percebi – a beleza é feita em osso e carnadura. Eu não o toquei, eu nem ao menos quero tocá-lo. Eu preciso somente entender – qual a natureza daquela forma? De que profunda fossa, de que oceanos, de que eras, de que jornadas vieste, ó pequeno, ó friável estrutura de músculos, ó singelo objeto existente? Jamais saberei, e estou feliz com isso. Porque desisti da intenção de pesquisar. Decidi que a beleza é inpesquisável. Quero apenas celebrar, quero apenas o júbilo de sabê-lo vivo, a alegria de retê-lo na lembrança, quero viver porque também ele, pequeno animal, vive e respira.  Estou satisfeito e seguro porque agora sei que a beleza existe. E se a beleza existe, é porque nada, absolutamente, foi em vão. De repente, o mundo faz sentido, tudo é claro, existe uma nota alta, uma alta música, um alto espírito. E ele, tão cego à força que nele labuta, tão ausente de si mesmo, dorme na cama mais ordinária da cidade. Será a beleza sempre assim, ausente, inconsciente de si mesma? Não vou mais perguntar. Eu cedo, enfim, à tua força. Eu apenas reabro em mim o espaço onde possas tu, pequeno cervo, estar aninhado. Eu capitulo e esqueço que a existência da beleza me inquieta. Pois assim, desnudo, vou a ti, sem dúvidas, os olhos puros, a face desanuviada. Vou a ti, inocente, como quem vai ao mundo.

Um comentário:

GH disse...

"De repente, o mundo faz sentido, tudo é claro, existe uma nota alta, uma alta música, um alto espírito. E ele, tão cego à força que nele labuta, tão ausente de si mesmo, dorme na cama mais ordinária da cidade".

Isso me fez lembrar muito da beleza de uma pessoa que eu amei assim, forte.