O amor é o peso do mundo.
Allen Ginsberg
Pensando sobre “amor”, concluí que não passa de um palavra. Talvez
seja, aliás, a mais estranha palavra já inventada. Ela serve para designar algo
muito vasto e descontínuo, algo muito vago e misturado. A vida me ensinou que
dor e amor são a mesma coisa. A mesma vida me ensinou que ódio e amor são irmãos,
estão tão próximos um do outro que é impossível distingui-los. Certa vez, há
muitos anos, vivi algo que imaginava ser “amor”. “Pobre filho enfermiço da vida”,
como diz Thomas Mann. Aconteceu que esse algo transformou-se abruptamente em
dor aguda. De dor aguda, transformou-se
angústia, e de angústia em pânico, e de pânico em quê? Loucura? Doença? Morte? Os
ingênuos louvam o amor – como se soubessem do que se trata. Os iludidos. Os
cegos. Não sabem, porque não viveram; entoam hinos ao amor porque nunca
experimentaram na carne um ferro em brasa. Se tivessem vivido sem reservas o
amor completo, incondicional, saberiam que seu objeto de culto equivale a um
estar-fora de si mesmo, a um perder-se, a um estraçalhar-se. Não desconfiam os
apologistas do amor que “amar” significa renunciar à liberdade, que gozo e amor
são um do outro longínquos, que o amor é irmão da guerra e não da paz, que amor
e alegria raramente se tocam – mas quando se tocam, se é que se tocam, algo de
miraculoso deve acontecer. Eu não sei, porque nunca provei dessa mistura. Os
ingênuos me replicarão: “Não, o amor salva, o amor enaltece, o amor reforça a
alma”. Eu até os entendo, porque esse discurso está fortemente enraizado na tradição. Mas
eu treplico: “O amor é perda, queda, fragmentação, desordem, confusão.” Gosto
das palavras “alegria”, “amizade”, “coragem”. Mas não me venham falar de amor,
como se soubessem do que se trata. Disso, só sabe quem nele mergulhou e emergiu
transtornado, doente de si mesmo, marcado com uma ferida incurável. E esses, não
falam: reservam para o amor um silêncio, talvez mesmo um rancor. Para quem fala
de amor como se falasse de alegria e saúde, eu reservo o meu desprezo. Pois
falam iludidos, e são estridentes, e escrevem hinos tediosos e defendem a eficácia
do amor contra as dores da alma. Mas o que sabemos sobre “alma”? E o que
sabemos sobre “dor”? São, como o “amor”, apenas palavras. E a linguagem é um
instrumento rude, incapaz de penetrar em reinos tão emaranhados.
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